Crítica: Excelentíssimos

Nos bastidores do vergonhoso Circo Nacional

Documentário mostra como um Congresso, majoritariamente masculino e corrupto,conseguiu derrubar Dilma

Por: Aline Daflon

O filme dirigido por Douglas Duarte tem como objetivo central apresentar a construção do processo de impeachment que levou à destituição do poder da ex-presidenta, eleita democraticamente, Dilma Rousseff. Excelentíssimos, assim como O Muro e O Processo, documentários que se inclinam sobre a deposição de Dilma, representa uma rica fonte de consulta histórica para as próximas gerações.

Como não seria possível falar do impeachment sem contextualizar com as eleições presidenciais de 2014, o longa relembra, logo de início, o descontentamento do candidato do Partido da Social Democracia Brasileira (PSDB), Aécio Neves, após a derrota nas urnas. Da mesma maneira, nos fez relembrar da aliança pútrida entre o Partido dos Trabalhadores (PT) e o Partido do Movimento Democrático Brasileiro (PMDB), que fez de Michel Temer vice da chapa de Dilma desde o primeiro mandato.

Excelentíssimos relembra como homens, muitos deles envolvidos em esquemas de corrupção, como Eduardo Cunha, que presidiu a sessão do impeachment, conseguiram retirar da presidência uma mulher que não estava sendo investigada pela Operação Lava Jato. A acusação contra ela eram as "pedaladas fiscais", o que, segundo especialistas do âmbito jurídico, não configuram crime de responsabilidade.  

O longa tem uma narrativa cronológica que facilita o entendimento a respeito do processo de impeachment. Com o uso imagens reais, torna possível que o espectador volte no tempo e reviva o cenário que marcou a grande crise política brasileira. Duarte optou por não utilizar excessivos recortes, principalmente em cenas de entrevistas. Através dessa estratégia, obteve-se uma intensa espontaneidade que gera credibilidade.

Ao acompanhar de perto os bastidores no Congresso Nacional, o documentário exibiu cenas cotidianas que não são transmitidas pelas mídias tradicionais. Além dessas, mostrou o momento de descanso dos policiais descompostos e, em seguida, recompondo-se com seus capacetes para conter as manifestações que ocorriam do lado de fora do Planalto, provocando, assim, um sentimento de proximidade e de humanização com relação aos policiais.

O enquadramento dado a ambos manifestos foi igualitário. Tanto os protestos pró-impeachment quanto os contra o golpe foram exibidos em suas grandes proporções. E depoimentos de ambos os lados foram ouvidos. Cenas épicas de milhares de brasileiros de verde e amarelo que foram às ruas contra a corrupção vestidos com a camisa da CBF, erguendo o pato gigante da FIESP, promovendo suas coreografias, não poderiam faltar. Da mesma maneira, também se fizeram presentes imagens do movimento de mulheres que gritavam contra um golpe, supostamente, sexista.

As cenas de fatos reais mostram o dia em que a política brasileira protagonizou o verdadeiro show de horrores em rede nacional. Em nome de Deus, da família, dos corretores de imóveis e até mesmo em memória de um dos torturadores mais cruéis da Ditadura Militar brasileira, como fez o futuro presidente do Brasil, Jair Bolsonaro, ao homenagear o coronel Carlos Alberto Brilhante Ustra , os deputados declaravam seus votos favoráveis ao impeachment.

O documentário é muito extenso, o que pode provocar um pouco de inquietação no espectador motivado pelo cansaço. Mas, para se ter uma contextualização desde as eleições presidenciais de 2014 até a deposição de Dilma em 2016, foi necessário. Apesar das 2h30 de duração, Excelentíssimos não se fez enfadonho ou redundante e foi capaz de trazer pegadas importantes que nos possibilitam entender o crescimento da extrema direita no Brasil, concomitantemente, com os resultados das urnas de 2018.

O filme não tem um desfecho, uma vez que os fatos ainda estão se desenrolando em tempo real. Contudo, ele abre caminhos para uma compreensão mais clara do cenário atual, que é o legado da grave crise política.  Excelentíssimos é uma obra que merece destaque pela forma fluida e didática que atinge o público e é um excelente documentário histórico digno de uma continuação pertinente ao Estado Democrático de Direito.

Direção: Douglas Duarte