domingo, 3 de fevereiro de 2019

Crítica: Se a Rua Beale Falasse


Um amor duramente marcado pelo racismo

 

Inspirado no romance de James Baldwin, If Beale Street Could Talk, traduzido para o português como Se a Rua Beale Falasse, não frustrou as expectativas. Dirigido pelo mesmo diretor de Moonlight: Sob a Luz do Luar, vencedor do Oscar de Melhor Filme em 2017, já era de se esperar uma obra no mesmo patamar. Barry Jenkins não desaponta e mais uma vez traz um cinema crítico-reflexivo ao levantar a questão do racismo.
A história é ambientada no Harlem nos anos 70 e contada, de forma atemporal, por Tish (Kiki Layne), uma jovem de 19 anos. Tish e Fonny (Stephan James), que eram amigos desde a infância, vivem um amor intenso, porém, bastante conturbado a partir do momento em que o rapaz é preso injustamente ao ser acusado de um crime que não cometeu. Com o namorado na cadeia, a garota descobre que está grávida e ela, com o apoio da família, luta todos os dias para conseguir provar a inocência dele.
Um ponto importante, destacado no início da trama, é a estrutura familiar de Tish: protetora e acolhedora. Uma jovem grávida, sem ter ingressado numa universidade, sem emprego e com o namorado preso. Mas, mesmo com o mundo inteiro caindo sobre a sua cabeça, ela consegue encontrar força e aconchego no ambiente familiar.

O longa tem uma forte pegada humanitária que nos transmite uma empatia tão profunda pelos personagens que é difícil conter as lágrimas. Da mesma maneira, Jenkins tem o cuidado em nos apresentar a moça que acusou Fonny injustamente de modo que nos tornamos capazes de compreendê-la em vez de julgá-la. A fotografia é bonita, a trilha sonora é envolvente e o figurino perfeito. O enquadramento foi fechado no rosto dos personagens diversas vezes, o que nos permite compartilhar das mesmas emoções. Todos os interpretes tinham vida e, sem exceção, o elenco teve uma excelente atuação. Mas, Regina King, que viveu a mãe de Tish, merece destaque.
Se a Rua Beale Falasse não é mais um romance clichê melodramático e, tratando-se de Barry Jenkins, nem haveria de ser. O cineasta de forma madura traz uma história de amor envolvente, mas que carrega consigo as profundas marcas do racismo. Não é uma obra para se entreter como um escape da realidade. Pelo contrário, é um filme feito para refletir com bastante incômodo diante da existência de uma verdade tão cruel.
Ser negro numa sociedade racista não é fácil e o drama vivido por Fonny e pelo amigo Daniel (BrianTyree Henri), que também esteve preso injustamente, ilustra muito bem isso.

Mas, Jenkins  também aponta que ser mulher  e negra numa sociedade racista e machista consegue ser duplamente pior. Tish vive isso diariamente ao ser objetificada e vista por muitos apenas como um pedaço de carne. Nada diferente dos tempos atuais em que a mulher negra continua sendo preterida pelo homem negro e erotizada pelo homem branco.
Em suma, Jenkins consegue cumprir bem o seu objetivo de tratar a problemática do racismo, que conduz à injustiça social, sem abrir mão da doçura e da poesia.

Direção: Barry Jenkins





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