Um amor duramente marcado pelo racismo
Inspirado no romance
de James Baldwin, If Beale Street Could Talk, traduzido para o português como Se a Rua Beale Falasse, não frustrou as
expectativas. Dirigido pelo mesmo diretor de Moonlight: Sob a Luz do Luar, vencedor do Oscar de Melhor Filme em 2017, já era de se
esperar uma obra no mesmo patamar. Barry Jenkins não desaponta e mais uma vez
traz um cinema crítico-reflexivo ao levantar a questão do racismo.
A história é ambientada
no Harlem nos anos 70 e contada, de forma atemporal, por Tish (Kiki Layne), uma
jovem de 19 anos. Tish e Fonny (Stephan James), que eram amigos desde a
infância, vivem um amor intenso, porém, bastante conturbado a partir do momento
em que o rapaz é preso injustamente ao ser acusado de um crime que não cometeu.
Com o namorado na cadeia, a garota descobre que está grávida e ela, com o apoio
da família, luta todos os dias para conseguir provar a inocência dele.
Um ponto importante, destacado no início da trama, é a estrutura
familiar de Tish: protetora e acolhedora. Uma jovem grávida, sem ter ingressado
numa universidade, sem emprego e com o namorado preso. Mas, mesmo com o mundo
inteiro caindo sobre a sua cabeça, ela consegue encontrar força e aconchego no
ambiente familiar.
O longa tem uma forte pegada humanitária que nos transmite uma empatia
tão profunda pelos personagens que é difícil conter as lágrimas. Da mesma maneira, Jenkins tem o cuidado em nos apresentar a moça que acusou Fonny injustamente de modo que nos tornamos capazes de compreendê-la em vez de julgá-la. A fotografia é bonita, a trilha sonora é envolvente e o figurino
perfeito. O enquadramento foi fechado no rosto dos personagens diversas vezes,
o que nos permite compartilhar das mesmas emoções. Todos os interpretes tinham
vida e, sem exceção, o elenco teve uma excelente atuação. Mas, Regina King, que
viveu a mãe de Tish, merece destaque.
Se a Rua Beale
Falasse não é mais um romance clichê melodramático e, tratando-se de Barry Jenkins, nem haveria de ser. O cineasta
de forma madura traz uma história de amor envolvente,
mas que carrega consigo as profundas marcas do racismo. Não é uma obra para se
entreter como um escape da realidade. Pelo contrário, é um filme feito para
refletir com bastante incômodo diante da existência de uma verdade tão cruel.
Ser negro numa sociedade racista não é fácil e o drama vivido por Fonny e
pelo amigo Daniel (BrianTyree Henri), que também esteve preso injustamente, ilustra
muito bem isso.
Mas, Jenkins também aponta
que ser mulher e negra numa sociedade
racista e machista consegue ser duplamente pior. Tish vive isso diariamente ao
ser objetificada e vista por muitos apenas como um pedaço de carne. Nada
diferente dos tempos atuais em que a mulher negra continua sendo preterida pelo
homem negro e erotizada pelo homem branco.
Em suma, Jenkins consegue cumprir bem o seu objetivo de tratar a
problemática do racismo, que conduz à injustiça social, sem abrir mão da doçura e da poesia.
Direção: Barry Jenkins
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